Anjos decaídos

Hoje estou que não me suporto com essa cara de todos os dias. Tenho carência das mesmas drogas ruins que uso para me manter viva. Resmungo os mesmos problemas que tenho desde a infância... quando te conheci. Hoje queria te olhar nos olhos cansados de sempre. Sentir teu hálito de palavras podres, guardadas desde o primeiro sapo que tiveste que engolir. Sentir teu abraço gelado, tuas mãos medrosas e os pés indecisos que não sabem nunca se querem ficar ou partir... Hoje eu te jogaria na cara as noites mal dormidas, as ausências tuas, a carência de tuas carícias. Contaria minha história ininterruptamente mil vezes, até que finalmente me fizesses calar com um beijo de língua. E te convidaria a pegar minha mão, mais uma vez, e dançar a dança dos traídos... uma, e outra, e outra, e ainda mais uma vez. Porque é isso que somos: anjos decaídos – traídos por suas próprias escolhas. Engabeladores de seus próprios destinos. Falsários e enganadores vis, como lobos ferozes em pele de cordeiro. Mas só hoje.